Um "Querido Ogro" diferente, talvez...

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Depois de tantos anos escrevendo pelo blog (mesmo nesses últimos, onde estou mais ausente por uma série de fatores), ouvindo e lendo tantas pessoas, com tantas conversas e textos buscando melhorarmos as condições emocionais e sociais de quem passa por situações complicadas de trauma, chegou a hora de começar a atacar em uma nova área de atuação.

Uma atuação que exigirá uma revisita a todos os meus conceitos, um reconhecimento de tudo o que foi vivido, aprendido e conhecido, para que possamos desenvolver a real aplicação de tudo o que tenho buscado há tanto tempo.

Minhas caras, o Querido Ogro virará Papai Ogro!

Exato: Juliana (namorada/esposa) e eu estamos entrando na 13ª semana de gestação – aprendi que pais grávidos contam assim a gravidez, chega de ser conta mês a mês.

Pois é. Acho que é natural quando se chega aos 34 anos e três anos de relacionamento, não? Os focos vão se distanciando das distrações e começamos a sentir saudade daquilo que nunca tivemos...

Como estamos? Bem... ainda lidando com toda a novidade que isso gera, a forma como isso acaba forçando a tomada de decisões com prazos muito curtos e justos. Mas felizes... um pouco assustados, mas igualmente felizes.

Dentre todas as minhas dúvidas ao longo da minha vida adulta, sempre tive medo do que passaria de conceitos a uma filha ou um filho: questões de religião, comportamento social, machismo, iniciativa pessoal, emoções, razões, o que esperar, o que deixar pelo caminho... São tantas que só de imaginar já fico com dúvida sobre qual dúvida esqueci-me.

De tantas coisas que estão surgindo aleatoriamente, me pego escrevendo de novo. Escrevo cartas, textos para alguém que ainda não me reconhece, mas que me lerá no futuro sobre toda essa tormenta sadia de agora. Espero causar mais risadas do que lamentos...

Efetivamente virará um blog, mesmo sabendo que ninguém mais curte tanto assim. Ficarão lá, de alguma forma acessível para quando precisarmos rever o que sabíamos e confirmar se tomamos as decisões corretas. Caso não tenhamos feito isso, ao menos poderemos saber onde erramos. Assim também espero discernir.

Entre compras de móveis, reformas de apartamento, escolha de nomes, indefinições quanto às rotinas que mudarão, apenas uma certeza tenho agora: o prazer pela escrita voltou a se fazer presente em mim.

Que eu consiga manter a chama ardendo ou queimando...
(Juliana, me ajude nisso, mais uma vez, por favor!)
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Pedofilia: #naofecheosolhos para isso (blogagem coletiva)

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Uma menina de 8 anos voltava da escola quando foi abordada por dois homens. Seis dias depois, foi encontrada morta com sinais de espancamento, dilaceração, estupro e dopagem. A mantiveram em cárcere privado por dois dias no porão e no terraço de um bar. Sob efeito de drogas, dilaceraram a dentadas os seios, parte da barriga e a vagina da menina. Depois, jogaram ácido corrosivo para dificultar a identificação de seu corpo e jogaram seus restos mortais em terreno próximo a um hospital infantil. Ambos eram pessoas pertencentes a duas famílias influentes do Espírito Santo, o que fez com que a polícia local fosse omissa na investigação e políticos fossem envolvidos em uma rede de acobertamento. Um sargento que investigava o crime chegou a ser morto durante a investigação.

A história poderia se passar em qualquer época. Mas aconteceu em 1973.


Ontem foi Dia Nacional de Combate ao Abuso e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data foi escolhida em memória a Araceli Cabrera Sanches, que em 18 de maio 1973 foi drogada, espancada, estuprada e morta por Paulo Constanteen Helal e Dante Michelini. Lola Cabrera Sanches, mãe de Araceli, também estava envolvida no crime. Os monstros foram condenados a 18 anos de reclusão, mas foram libertados e seguem entre nós até hoje, impunimente caminhando entre você, seus filhos, nossas crianças.

O dia que marca a morte de Araceli foi ontem. Mas hoje muitas crianças ainda seguem reféns, sob esse manto da impunidade e do acobertamento familiar. Hoje muitas crianças podem não sofrer o que Araceli sofreu, mas são igualmente violentadas e abusadas, molestadas e caladas por uma sociedade que ainda insiste em se manter presa aos olhos de 1973.

Seus corpos não são dilacerados como o de Araceli, mas são abocanhadas em suas dignidades e inocências cada vez que monstros que estão ao seu lado agem e você não desconfia por ele ser o amigo da família.

Não são dopadas como Araceli foi, mas sofrem com um inebriante estado de ameaça emocional por vizinhos e avós e tios e padrastos que as colocam no colo, sob pretexto de um inocente carinho, e molestam asquerosamente enquanto ordenam para ficarem quietas ou sofrerão as consequências, já que “ninguém vai acreditar em você”.

Não são encarceradas como Araceli foi, mas se fecham num enclausuramento emocional que perdurará toda vida, refletindo em todas suas escolhas e posturas, afetando todas as relações interpessoais e amorosas e sexuais, uma vez que os monstros insistem em voltar na penumbra dos corredores de seus pensamentos.

Não são corroídas em sua carne como Araceli foi, mas toda sua alma será desmanchada em lágrimas e revolta e culpa e autojulgamento, mesmo que não tenha tido responsabilidade alguma sobre o que aconteceu. Mas ainda assim irão corroer a revolta em seus corações, se rebelarão contra a própria essência, na tentativa de matar a memória daquela que tanto sofreu; na tentativa de não sentir mais o tenebroso asco do toque malicioso e catártico.

Não, você não molestou ninguém. Não, você não tocou em ninguém. Mas sim: você pode ter sido culpado disso quando fechou os olhos para uma criança que precisava apenas que olhasse para ela; que apenas precisava que desconfiasse do vizinho, do primo, do tio, do pai, do namorado; que apenas deixasse essa eterna mania de achar que é sempre com os outros que acontecem tais atrocidades.

Mas isso não acontece assim, né? Será?

“Aos 6 anos, fui vítima de abuso sexual. O pedófilo era um vizinho de idade avançada, avô de um amiguinho de infância”


“Comecei a me prostituir aos 7 anos, vendida por uma tia. Tive minha infância roubada por quem deveria me proteger.”


“Descobri o sexo através de uma das empregadas. Ela tinha um relacionamento perturbado com o porteiro e o cara fez a cabeça dela pra me envolver nos jogos sexuais dos dois”


“Então descobri que ela foi abusada pelo próprio pai dos 6 aos 11 anos. De uns meses pra cá, ela já não quer mais fazer sexo”


“Acordei sentindo algo subindo no meu corpo. Quando abri os olhos, era meu cunhado passando a mão em todo meu corpo”


“Fui abusada quando tinha cerca de 5 anos pelo meu vizinho. Ele tirava a minha roupa, passava a mão em mim...”


"Quando eu tinha 13 anos, fui estuprada pelo meu irmão mais velho..." 


É... e ainda assim você acha um absurdo desconfiar.



*Esse post faz parte da Blogagem Coletiva #naofecheosolhos organizada pelo Instituto Abihpec para o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes
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“Aos 6 anos, fui vítima de abuso sexual. O pedófilo era um vizinho de idade avançada, avô de um amiguinho de infância”

Posted: | por Felipe Voigt | Marcadores: 4 comentários
Querido ogro,

Pra começar, digo que desconfio da sua disponibilidade e vontade gratuita de ajudar. Receio de que casos tão complexos quanto os que li sejam pra ti e pra outros leitores um meio de diversão... como diz o ditado: "Pimenta nos olhos do outro é refresco". Espero estar enganada.

Mas ainda assim, vou me aventurar e contar parte da minha história:

Aos 6 anos, fui vítima de abuso sexual. O pedófilo era um vizinho de idade avançada, avô de um grande amiguinho meu de infância. Esse velho costumava se sentar num banquinho na frente da casa dele. Ali, me pegava no colo e colocava as mãos dentro dos meus shorts, por trás, e ficava me masturbando até que seus dedos ficassem úmidos. Depois, ele entrava em casa, com a mão próxima ao nariz, provavelmente sentindo prazer com o cheiro da secreção que saía.

No meu primeiro dia de aula, minha mãe me arrumou toda, e quando passamos na porta da casa desse tal velho asqueroso, ele me elogiou e pediu um abraço. Ele era tão maquiavélico que conseguiu me colocar em seu colo e, enquanto distraía a minha mãe com conversas, abusou de mim.

Pensa numa criança angustiada.

Aos 12 anos, conheci uma menina que tinha sofrido abuso e tinha tido várias relações sexuais. Essa menina era mal vista pelos meus colegas, mas nós ficamos amigas. Pude observar que ela tinha uma deformação na vagina, como se os grandes lábios ficassem visíveis. Eu tive a péssima ideia de esticar meus clitóris para ficar parecida com ela. Hoje tenho muita vergonha de minha vulva, e espero um dia poder fazer uma cirurgia para reverter.

Enfim, tomei trauma de escola e ódio dos meus pais. Quando tive coragem de contar pra eles, eu já tinha 19 anos e estava envolta numa depressão. Eles reagiram me dando uma surra horrível e humilhante.

Hoje, aos 27 anos, moro com meu namorado, nos damos bem, mas ele não sabe dos detalhes dessa experiência. Tenho muita vergonha do meu corpo... e da minha história... sinto-me profundamente só e desprotegida.

Angústia é mato, meu caro...

Pode publicar a minha história, mas preserve minha identidade, ok?


Minha cara desconfiada;

Desconfia por que? Onde leu algo, no meu blog, algo indique que eu esteja me divertindo com o que recebo? Onde, em sua vã consciência, estou usando daquilo como simples meio de entretenimento próprio e alheio? Colocações extremamente lamentáveis, ainda mais vindo de alguém que passou por um trauma sexual na infância... Deveria entender, melhor do que ninguém, que o que tento fazer aqui é tão somente levar um pouco de alívio, mesmo que momentâneo, a quem sofreu abusos. Realmente lamentável e desnecessário colocar isso dessa forma...

Agora que já te dei uma bronca, vou relevar o que me disse no começo e esquecer que duvidou de mim de forma tão ácida e radical, mas por conta de entender que está arredia com o mundo em geral. E, mesmo com tanta desconfiança e dúvida, ainda optou por confiar em mim. Isso pode ser um avanço para conseguir o que tanto precisa: voltar a se sentir segura e confiar em alguém de forma gratuita e sem medo.

Disse que foi aos 6 anos e se lembra de todos os detalhes, mas acredito que muitos dos espaços em branco na sua memória você tenha preenchido com o que acredita ser a realidade do que aconteceu. Você se lembra de pequenos flashes do que houve, o resto sua mente tende a preencher de forma ou mais punitiva ou mais amenizadora. No seu caso, está se punindo ainda mais do que deveria e precisa.

Mesmo que tenha puxado seu "clitóris" pra ficar parecido com o da sua amiga, isso não faria de sua vagina o que ela é hoje. Não é porque ela é mais proeminente que isso foi causado por conta do que fez na adolescência ou sofreu na infância. Nem mesmo com sua amiga foi assim. Conheço mulheres com a região genital mais avantajada e nem por isso foi culpa de algo como o que você fez. Isso é tão somente sua anatomia e não deveria se envergonhar disso.

O que acontece é que, talvez, tenha vergonha do seu sexo em si, da sua vagina e do que ela pode te causar de lembrança física e emocional. Você projeta ali todo seu trauma sofrido e por isso tende a repudiá-la com veemência. E já vimos que repúdio é seu forte, foi assim que abriu esse e-mail, certo? Por que não estaria fazendo o mesmo com sua vagina? Será que se ela fosse mais fechada, não iria sentir vergonha do mesmo jeito?

E ainda: confiou em seus pais e sofreu retaliação deles. Isso apenas fez com que todo seu processo se engessasse, retraindo ainda mais você nesse mundo só seu e que ninguém parece entender, não? O grande fator agora é: como você pode superar esses enormes pequenos obstáculos que tanto te prendem? Como conseguir deixar isso para trás, sem parecer que é um problema pequeno e sem valor?

Justamente lidando com isso dessa forma: é algo enorme, mas que se transformará em pequeno conforme você for dando menos valor a isso. É impossível? Não. E como podemos fazer isso? Resgatando o poder sobre você, sobre seu corpo, seus desejos e suas angústias. Você não vai querer deixar que esse vizinho asqueroso ainda tenha poder sobre você. Ele pode ter tido, por um instante, sobre aquela menina de 6 anos, mas não terá mais sobre essa mulher de 27. E quem vai tomar conta daquela menina é essa mulher em que você se transformou. É sua obrigação tirá-la dele. Toda essa defesa que criou contra o mundo é o que fará você conseguir resgatá-la daquele banco, daquela situação...

É preciso encarar essa situação, não tente deixá-la pra trás. Quanto mais medo tiver de revisitar esse passado, mais grandioso ele se tornará dentro dos seus pensamentos e coração. Conforme for voltando e acendendo velas de clareza emocional, menos escuros estarão esses corredores do seu passado. Uma coisa por vez... no seu tempo, na sua dedicação e no seu limite. Repasse esses momentos que elencou para mim e busque uma compreensão mais madura para o que houve.

Até mesmo com seus pais: quais motivações eles tiveram pra agir daquela forma? Quais limitações ambos possuem em educação, religião, compreensão do mundo? Às vezes, eles são somente tão ignorantes quanto a maioria das pessoas que conhecemos. E, infelizmente, cabe a nós entender melhor, cabe a nós superar suas ignorâncias e mostrar que somos maiores que isso tudo. Não digo para perdoar, porque isso é muito particular e nem faz tanta diferença assim. Mas compreender e entender as motivações faz muito mais por você do que um simples perdão.

Tenha todo seu momento de catarse, se revolte lembrando, chore, soque travesseiros e almofadas, engula o choro, respire e tente. Se não der na primeira vez, tente novamente. Com mais raiva, com mais choro, com mais bagunça mental... até conseguir acessar o que precisa.

Não tenha medo de confiar. Se ainda consegue sentir alguma segurança em alguém a ponto de morar com ela, é sinal de que há ai dentro um vestígio daquela menina que ainda pede por segurança e proteção. Você confiou a mim sua história, mesmo achando que eu me divertiria com isso. Por que não tentar confiar mais nele ou em uma amiga? Conte alguma coisa a mais, não ache que irão reagir como seus pais reagiram.

Ainda há quem vale a pena confiarmos nossos medos e fragilidades. Aqui no blog somos dezenas, centenas... você viu, mesmo desconfiada, que é possível. Por que não seria com você, minha cara?

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“Lembro que ele brincava comigo e em uma dessas vezes começou a passar a mão em mim, me lambia e me fazia chupa-lo”

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Querido Ogro,

Tenho 17 anos, sou filha única de mãe solteira. Desde os 6 meses de vida, minha mãe pagava alguém pra tomar conta de mim, pois ela trabalhava de empregado doméstica. Já passei pelas mãos de muita gente. Aos 3 anos, em uma festa de final de ano, passei com minha família, na casa dos meus tios e o pai desse meu tio era um velho, não me recordo muito bem, mas lembro que minha mãe me colocou no quarto pra dormir e lembro que ele abusou de mim, não com penetração.

No dia seguinte eu contei a minha mãe, lembro que foi uma confusão danada e com isso me senti culpada e assustada. Quando eu tinha 4 ou 5 anos, minha mãe me levava pra casa de uma patroa dela que me adorava, me levava pra sair e tudo mais. Essa patroa tinha um irmão, devia ter uns 30 anos, era magro careca, tinha aparência de "lesado, calmo e inofensivo... mas era pura enganação. Lembro que ele brincava comigo e em uma dessas vezes começou a passar a mão em mim, me lambia e me fazia chupa-lo. Me culpo porque de certo modo eu gostava e isso me causa ódio até hoje.

Sempre que minha mãe me levava era a mesma coisa. Até que minha mãe parou de me levar, mas aos 7 anos descobri que minha mãe tinha um caso com ele. Nossa, aquilo pra mim foi um baque total, me senti com nojo, suja, má pessoa, uma puta. Como entender que o cara que abusava de mim, tinha caso com a minha mãe? E minha mãe, coitada, não sabia disso. Ela sempre teve cuidado em relação a isso, sempre me falou que eu podia contar pra ela se alguém voltasse a abusar de mim, mas eu nunca tive coragem de contar a ela... por medo, não sei explicar.

Também com essa idade dos 4 ou 5 anos, meu vzinho começou a abusar de mim, me lambia fazia chupa-lo e tal, como sempre tinha vezes que eu gostava, mas depois que passava me sentia um lixo com nojo de mim. E assim foi até os 9 anos. Nunca ninguém desconfiou de nada. Mas depois dos 9 anos comecei a não querer mais e falar que se ele continuasse iria contar tudo a minha mãe. Mas ai que começou todo o problema em minha mente: quando relembro meu passado imagino "cara, essa merda toda essa sujeirada acontecer comigo". E a culpa não sai de mim.

Com 16 anos comecei a me cortar toda vez que relembrava de tudo, sempre passei aquela imagem de "durona, forte, com sorriso no rosto fazendo todos rirem". Mas é só imagem mesmo, carrego comigo uma tristeza enorme, uma culpa sem tamanho, um nojo às vezes de mim mesma. Mas isso me afeta em relação as pessoas, nunca consegui confiar em ninguém, sempre achei que nunca ia me dar bem, que ia me ferrar, pensamentos negativos.

Namoro há um ano, mas essa semana resolvi contar tudo pro meu namorado, pois eu ficava triste de uma hora pra outra e isso estava atrapalhando muito a gente. Deitados na cama eu comecei a contar, e atitude dele me surpreendeu, pois pensei que ele iria me julgar, por a culpa em mim, mas não: ele me abraçou forte e chorou junto comigo. E esta me ajudando em relação a isso. Só que eu sou muito fechada, sempre fui de guardar as coisas pra mim e sofrer calada. Por mais que eu esteja próxima dele, por uma atitude egoísta acho que não devo encher o saco dele com meus problemas, meus "fantasma do passado".

Queria muito tirar essa culpa de mim, deixar meu psicológico "normal", sem esses pensamentos ruins. Acho que ninguém pode me ajudar, não consigo confiar plenamente em ninguém, ando com medo de perder aqueles que eu amo. Minha mente é perturbada totalmente.

O que eu mais queria ela me livrar dessa maldita culpa. E não tenho coragem de contar tudo isso a minha mãe, acho que nunca vou ter.

E quero dizer quem está lendo esse post: conte a alguém, desabafe com alguém, vai se senti aliviada, procure ajuda, pois isso pode acabar com você por dentro se ficar de boca fechada. E Querido Ogro: espero que leia, e passe este post em seu blog. E tenho fé que vou me curar destes "fantasma do passado", e quando me curar estarei te comunicando. Desde já te agradeço!!


Minha cara,

A tua inconstância de pensamento está muito natural por conta da sua fase atual de vida: aos 17, pequenas grandes transformações se agigantam à sua frente e não sabe como lidar com elas. Seja vida acadêmica, profissional, amorosa, social... tudo está prestes a mudar com uma razoável intensidade e isso faz com que você reveja basicamente todo seu comportamento e passado, atrelando uma coisa a outra. Mas há como dissociar algumas... muito do que você sente em relação ao mundo é natural da sua idade.

Veja: diz que foi abusada aos 3, depois aos 4 ou 5... até os 9. E todos com o mesmo padrão. E em todos diz que se sentia suja, uma puta. Mas como uma criança pode se sentir “puta” sem sequer ter o conceito disso? Como pode se sentir suja sem sentir que isso seja algo sujo, efetivamente? O que vejo é que, sim, passou por um trauma de abuso com alguém, mas acabou agora alimentando isso mais do que deveria na sua cabeça e generalizando com quase todos os homens que tiveram acesso a você. É possível que esteja preenchendo as lacunas do que se forçou a esquecer com algumas fantasias, pra fazer sentido à você e buscar uma resposta do motivo pelo qual passou por isso.

Entenda que não estou te imputando culpa ou responsabilidade, tampouco dizendo que inventou tudo. Mas pense: seria possível que algumas das coisas que colocou sejam baseadas em um único abuso e com isso toda sua percepção acabou se abalando e se manchando com isso? Criou alguns mecanismos de projeção e ocultação como forma de defesa, mas tudo isso se tornou confuso demais pra lidar e acabou bagunçando todo seu racional em uma idade onde a racionalidade está frágil e se formando com delicadeza.

Um abuso em uma criança traz sequelas imediatas e você conseguiu contar logo na primeira vez que aconteceu. Isso não costuma acontecer: a criança se fecha, conta de forma acidental ou revela através de comportamentos sociais e emocionais completamente diferentes dos que ela costumava ter. Costumam apresentar alguns mecanismos de defesa que se evidenciam quase fisicamente. Mesmo com toda a carga que houve na primeira vez, é bem provável que você contasse nas vezes seguintes. E caso tenha sido de outra forma, com mais peso emocional e parcela maior de medo, seu comportamento seria diferente em alguns pontos.

Sei que algumas mães ignoram os apelos não-verbais dos filhos nesses casos, ainda mais sendo com alguém próximo como namorado, amantes ou padrasto. Mas são esses os que mais precisam de vigília e desconfiança. Talvez sua mãe não tenha notado justamente por “confiar” no amante e, na própria insegurança e medo, achar que nada daquilo aconteceria de novo. Porque se ela tivesse a confirmação de que a filha foi abusada novamente, ela estaria internamente assumindo a incapacidade de protegê-la. Com isso, muitas mães fecham os olhos, por medo do mea culpa... é triste, é medonho, mas é mais real do que imagina.

Como esse tipo de abuso não deixa sintomas físicos, já que não houve penetração, as sequelas emocionais são mais confusas e difíceis de diagnosticar. Por isso mesmo pode ser mais difícil alguém precisar exatamente a época em que isso aconteceu. E entendo que seja o seu caso: sofreu algo quando criança, abstraiu por muitos anos e agora, por conta de ter uma mentalidade diferente e uma sexualidade se aflorando cada vez mais, acabou preenchendo agora os espaços vazios na mente e tomou para si como verdade. Por isso afirma que se sentia como puta e suja, porque é como se sentiria caso isso acontecesse hoje, entende? Está se projetando hoje para o seu passado.

Por que omitiu, por exemplo, toda sua fase adolescente no relato que me mandou? Justamente nessa fase haveria muitos sintomas decorrentes do que te aconteceu no passado: seu primeiro beijo, sua primeira transa... tudo isso teria um peso diferente por ter se lembrado dos abusos. Mas acabou omitindo. Entende como pode haver uma confusão de períodos e casos sofridos?

O que peço a você é que use suas próprias palavras ao final do relato: “E quero dizer quem está lendo esse post: conte a alguém, desabafe com alguém, vai se senti aliviada, procure ajuda, pois isso pode acabar com você por dentro se ficar de boca fechada”. Então faça isso com alguém que efetivamente consiga te trazer à tona de toda essa confusão que tem passado. O primeiro passo você teve: contou pro seu namorado, contou pra mim. Isso exigiu muita coragem. Agora procure um profissional. Com tudo isso que está disposta a fazer, superar o que aconteceu, certamente ele poderá te guiar com clareza nisso tudo que está trilhando para você. Todo seu comportamento depressivo, de se cortar e se culpar requer um acompanhamento preparado para te auxiliar a se ver como vítima e não como responsável.

E sim: conte para sua mãe. Seja honesta, conte da forma como sente e vê e sabe, igual fez por aqui. Diga que quer apoio dela para buscar um psicólogo. E que vai precisar dela ao seu lado. Aproveite essa coragem toda que está tendo. Assim como os relatos que acabou vendo na mídia te trouxeram de volta o medo e a vergonha e a culpa, lidar com isso de forma consciente e efetiva irá te ajudar a exorcizar os fantasmas. Use esse momento...

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“Tenho 20 anos, sou casada e saio com o tio do meu marido”

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Querido ogro!

Tenho 20 anos, sou casada há três, mas estamos juntos há cinco. No final de 2011, comecei a conversar com o tio do meu marido pelo MSN, ele é irmão do meu sogro e tem 31 anos. No começo, não era nada de mais, até que ele começou com umas indiretas e eu o cortava, mas não deixava claro que parasse com aquelas conversas. No começo do ano passado, tive uma briga com meu marido e acabei saindo de casa. Ele ficou com uma menina na rua, mas só a beijou e acabamos voltando.

Contei pro meu marido que o tio dele havia dado em cima de mim, ele não deu muita bola, mas contou pro pai dele. Eu e o tio continuamos nos falando, pois fiquei com raiva do meu marido ter ficado com outra. Dei bola para o tio e um mês depois saímos e ficamos em um motel. Depois continuamos a manter as conversas no Face, conversávamos a tarde toda. Ele namorava há alguns anos, mas parecia gostar de conversar comigo: dizia que passava o dia todo pensando em mim e eu também passava a noite pensando nele e não via a hora de poder falar com ele.

Mas um dia depois que saímos, meu marido abriu a lixeira do computador e viu algumas conversas pesadas dizendo que íamos sair e tudo o que se pode imaginar. Ele não viu as fotos que nos tínhamos trocado e nem a conversa do dia em que combinamos de nos encontrar...

Meu marido, claro, ficou louco. Eu disse que fiquei muito magoada quando ele tinha ficado com outra, mas não disse que tínhamos saído. Então apaguei o tio do meu Face... Passou um ano e nós nunca mais nos falamos. Nesse período, meu marido ficou com outra novamente, mas só de beijo de novo e eu, com raiva, contei que tinha transado com o tio. Aí terminei com meu marido e voltei novamente.

Depois deste um ano sem nunca mais nos falarmos, o tio foi morar com a namorada, mas eu sei que ele não tem muito desejo por ela, mas gosta dela assim como eu do meu marido. Eu o adicionei de novo e voltamos a conversar. Queria muito ter ele novamente e ele também queria. Aí conversávamos e eu o excluía toda semana. Há alguns meses, eu e meu marido fomos passear na casa de parentes dele e o tio estava lá. Me dava umas olhadas e eu também, tudo muito discreto.

No dia seguinte, ele mais do que depressa quis me ver. Minha intenção era esta mesmo, ir na casa dele pra atiçar. Então nos encontramos no mesmo dia e tudo foi maravilhoso, olhar nos olhos dele mexia com meu coração e eu disse que não viemos aqui nos olhar nos olhos, disse que não podia acontecer nada mais do que sexo, mas eu já estava caidinha por ele... mulher é boba! Foi tudo tão bom, ficamos umas duas horas juntos.

Meu marido meio que desconfiou de umas mensagens no celular, mas nada de muito revelador. Tive medo de que alguém descobrisse e eu ficasse como safada, aí contei pro meu sogro que o irmão dele dava em cima de mim. Meu sogro ligou pra ele e disse que meu marido e ele já sabiam de tudo, que era melhor botar uma pedra em cima e esquecer, mas que uma hora eles iam ter uma conversa séria. Então o tio me mandou uma mensagem dizendo: "o que você tá querendo? Por que disse pro teu sogro que eu tava dando em cima de você?". Enrolei e o fiz acreditar que era só desconfiança do meu sogro e que eu não havia falado nada.

Então criei um perfil falso para conversarmos, mas depois disso nada mais foi igual. Ele quase não entrava pra falar comigo e quando falava não era a mesma coisa, não mostrava interesse em mim. Mas os dia passaram e ele disse que ia entrar em férias e que poderíamos nos ver. Disse que não falava quase comigo porque não tinha tempo. Mas hoje ele diz que sente um desejo por mim e que um dia vamos sair de novo, mesmo ele sentindo muito medo.

Diz ainda que se não fosse proibido talvez não fosse querer tanto. Às vezes ele me irrita falando pra eu arrumar mais uma mulher pra ficarmos nos três e isso me deixa brava. Ele já insistiu várias vezes e disse que não vai mais tocar nesse assunto. Falou também que no começo do meu namoro com meu marido ele sentia desejo por mim e me achava gostosa e que sai só comigo, que ninguém o que porque ele é feio...

Então lá vão as minhas duvidas: querido mago, o que será que ele pensa de mim? Como ele me vê? Será que ele fica comigo só porque não tem outra opção a não ser a mulher sem graça dele? Ou será que ele só gosta de sentir o medinho do proibido? Ou será que ele sente algo mais e evita falar comigo pra não ficar mais envolvido? Me diz: o que você acha de tudo isso?

Minha cara jumenta;

Quer mesmo saber o que penso? Penso que você é burra e está brincando com coisa séria. Há limites pra tudo e você conseguiu extrapolar alguns apenas por birrinha de ciúme e chifradas trocadas. E está sendo iludida e usada e acaba usando isso pra alimentar seu ego, numa necessidade absurda de autoafirmação ante seu marido: “se você pode, eu também posso”.

Qual a razão de ter um “romance” (que de romance não tem nada) com um parente tão próximo? Você poderia ter isso com qualquer outro, mas não: opta por fazer na cara de todos e sempre se colocar como a vítima, que está sendo assediada e que não fez nada de mais pra isso acontecer, que está quieta no seu canto sendo a boa esposinha. Porra: menos, né!?

Está agindo como uma típica adolescente que faz joguinho pra massagear o ego, mas já tem 20 anos e é casada. Não dá mais pra brincar sem esquecer-se das consequências dos seus atos. Está se achando a espertona, mas está sendo usada por um cara que sabe que você vai cair em qualquer coisa que ele disser. O fato dele querer outra mulher junto apenas indica isso: você é tão somente a sobrinha gostosinha que ele fode de vez em quando. Isso também é bom pro ego dele, o faz se sentir “pegador pra caralho” e ainda te trata quase como uma puta, no mal sentido da palavra. Nada mais nelsonrodrigueano!

Mas você, no auge da sua experiência em manipulação, acredita que haja algo a mais nas posturas dele e banca a apaixonadinha. Inclusive trata com desdém a namorada dele, a tachando de “sem graça”. Acredite: a sem graça pra ele é você. Ele diz o que você quer ouvir e você cai como uma tonta. E enquanto for casada e for proibido, o tesão vai falar mais alto e ele pensará apenas com a mesma cabeça de sempre. O único diferencial seu é ser uma foda fácil e mais excitante por ser perigoso.

E você chega a ter um grau tão incrível de ingenuidade que se acha fodona e acredita que seu marido apenas tenha saído pra beijar as negas que beijou ano passado. Escuta: assim como você deu pra outro, ele também comeu outras. Mas isso não faz muita diferença: os dois estão brincando de casamento, mesmo... essa relação não existe, não é séria.

Mas como você agiria, por exemplo, se sua tia estivesse transando com seu marido? Iria se sentir como? Uma idiota, eu sei, mas como agiria? Iria sair com outro só pra dar o troco? E ficariam nesse círculo até quando?

O que te levou a conversar com o tio é justamente a imaturidade típica da sua idade: era adolescente na época, não tinha idade pra estar num casamento, tampouco em uma relação dita estável. Seu casamento é uma brincadeira de pós-adolescentes, mas estão levando isso a um nível perigoso e frágil demais. Lembre-se: tudo poderá, sim, estourar no seu colo justamente por ser mulher e estar provocando algumas reações do tio do seu marido. E certamente todos acusarão você e não tanto ele. Homem é meio corporativista nessa hora: sempre culpa a mulher por isso. E você não terá cu pra aguentar as consequências e dificilmente terá argumentos para se defender.

Para de usar a situação pra se sentir a bonitinha gostosinha assediada. Isso chega a ser ridículo até mesmo pra alguém aos 20 anos. Quer fazer, faça. Mas tenha, ao menos, a decência de terminar seu casamento. Não há amor e o respeito mútuo claramente se perdeu. O que te faz ainda estar casada? Comodismo? Manipulação?

E aposto que, ao se separar, o tio deixará de te procurar. Você perderá a graça. Ele irá alegar que precisa preservar a família dele agora e blá blá blá. Mas você será muito mais idiota se preferir se manter casada apenas para continuar a sair com alguém que não tem o menor respeito por você. Mas se nem você está se respeitando, como vai esperar isso dos outros, não?

Você está repetindo erro atrás de erro, de forma infantil e inconsequente. Larga a mão de ser criança mimada... porque é assim que tem se portado: uma criança que não quer perder o brinquedinho, mas também não abre mão de brincar com o brinquedo alheio e chora pra mãe quando dizem que foi você quem começou a briga!

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“Comecei a me prostituir aos 7 anos, vendida por uma tia. Tive minha infância roubada por quem deveria me proteger.”

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Querido Ogro...

Tenho 33 anos, sou casada, tenho um filho e uma vida bem tranquila. Mas minha vida nem sempre foi assim... Comecei a me prostituir aos 7 anos de idade, vendida por uma tia. Tive minha infância roubada por quem deveria me proteger.

Minha adolescência foi regida com muito sexo e cocaína, enfim, uma verdadeira loucura. Fui atendida algumas vezes por psicólogos do juizado de menores, mas nada adiantava, eu não sabia explicar porque eu fazia aquelas coisas e tinha medo de denunciar minha tia. Aliás, eu nem sabia que podia...

Aos 20 anos tive uma chance de mudar de vida, me casei e hoje tenho uma vida de princesa, não me falta nada. Mas, de tempos em tempos, sou puxada para baixo por uma força maior que eu, sinto como se aquela menina voltasse e jogasse na minha cara todas as mazelas que passei... Sinto-me novamente desamparada, novamente traída, morro de medo de invadirem minha casa e me levarem de novo pra aquela vida imunda.

Tenho sonhos agitados que, mesmo depois de acordada, tenho dificuldade de entender onde estou... Sinto ódio de mim por ter vivido tudo isso, sinto um nojo imenso do meu corpo, tenho uma raiva de mim. Antes, quando eu entrava nessas crises, ficava nervosa, quebrava tudo dentro de casa, gritava, chorava, mas aprendi que isso não é de Deus e passei a me cortar. Na primeira vez que fiz isso, quando acabei, consegui ver que estava no banheiro da minha casa, me senti mais calma e voltei a dormir. Agora todas as vezes que sou tomada por esses sentimentos, fujo pras minhas lâminas.

Estava até fazendo terapia, mas me senti iludida, pois eu achei de verdade que esqueceria tudo o que me aconteceu, mas infelizmente isso não está acontecendo, então não vou mais. Fora que minha psicóloga vive minimizando minha história, ela vive falando de pessoas que "sofrem de verdade", que tenho tudo pra ser feliz e não aproveito, que tenho que sair do "modo passado". Enfim, me sinto frustrada por não conseguir esquecer e dar a volta por cima... a cada pesadelo me sinto multilada, condenada a reviver cada detalhe daquele inferno que foi minha infância e adolescência.

Sei que me cortar também não é a maneira mais correta de lidar com isso, mas não sei o que fazer mais pra aliviar esse ódio todo, essa dor imensa. Peço a Deus todos os dias pela morte, me sinto um zumbi, uma morta viva, não sinto prazer em nada, tudo o que faço, faço por amor ao meu filho e marido, não quero que eles sofram por causa do meu passado imundo. Mas a cada dia que passa tem sido cada vez mais difícil continuar vivendo. Me ajuda, por favor, me salve de mim mesma...


Minha querida desesperada;

Imagino que esteja foda pra caralho lidar com os fantasmas do passado, mas teremos que lidar com um de cada vez. Entendo que o desespero imponha imediatismos, mas peço que leia uma conversa que tive hoje com uma pessoa que me procurou há tempos com algo que aconteceu a ela na adolescência e causou um trauma que perdurou por anos, assim como em você perdura:

- Com relação ao que te aconteceu, isso tem te incomodado? Amenizou? Volta às vezes a assombrar? Como tem lidado com isso?

- Honestamente? Depois de ter me aberto com você e toda sua ajuda, a coisa foi sumindo da minha memória completamente, ao ponto de outro dia me pegar falando no assunto sobre outra pessoa, como se aquilo nunca tivesse ocorrido comigo. Tudo mudou, perdi medos, muitos medos em vários aspectos. Até mesmo posições no sexo que pra mim não eram prazerosas pelo trauma, hoje são minhas favoritas! Minha vida mudou. Eu chorava com cenas de estupro em um filme, por exemplo...evitava assistir esse tipo de coisa, me escondia. Hoje assisto, claro que com a revolta de ver um FDP fazendo aquilo, mas com pena da moça do filme e não com pena de mim. Não mais. Dentro de mim a raiva e o ódio que sentia do cara que fez comigo, passou... ele hoje não fede e nem cheira! Você me fez descobrir que sou maior que o fato, eu defino a situação e não a situação me define... é isso!

Entende como há alternativas, como é possível conseguir usar exemplos de outras pessoas de forma positiva, sem que você tenha que pensar que “fulano tem mais problemas que eu” ou que seu problema é menor? Não estou minimizando o seu problema ao citar outra pessoa: estou justamente dando o devido respeito a ele e te mostrando que é possível buscar inspirações. Há um estranho alívio ao saber que não é a única a sofrer por coisas parecidas.

A primeira coisa que tem que fazer é: parar de ver que se prostituía. Você era aliciada e isso tem diferença. Usar esse termo “se prostituir” impõe a você uma realidade pesada e alivia a culpa de quem realmente é culpada: sua tia! Mesmo que tenha durado até a adolescência: você fazia obrigada, sob o manto do medo da condição que lhe fora imposta. E mesmo que o sexo tenha se tornado depois algo inconsequente e, por vezes, promíscuo: não foi uma decisão sua, lhe tiraram o poder de escolha e o status acabou se estabelecendo de forma errada no seu cotidiano. Era o que você tinha de referência, mesmo sendo uma referência errada e deturpada. E não por sua culpa...

Quando diz que por vezes aquela menina volta, sinta que ela faz isso não pra te jogar na cara tudo o que você fez: ela volta pedindo sua ajuda, para libertá-la dessa imagem pesada na qual a prenderam. Você ainda a vê como uma prostituta, por isso sente que ela volta te jogando tudo na cara. Pegue essa menina pelo braço, coloque-a no colo e a ouça. Faça com ela o que você gostaria que fizessem por você naquela época: proteja-a, não a condene a esse inferno. É pesado demais para ambas, vocês não merecem mais disso em suas vidas.

Os sonhos agitados, o medo de voltarem a te machucar, os cortes... tudo isso reflete a não aceitação do que fizeram e a sua necessidade de superar isso. Mas acredito que esteja fazendo da forma mais agressiva possível: pra você é ou esquece de vez ou nem tenta começar a superar. Esse extremismo te joga justamente no extremo ruim da situação: você surta, perde o foco, não respira e corre buscar paliativos para te aliviar. Era assim quando quebrava tudo, é assim quando quebra as barreiras de sua pele com suas lâminas.

Só que é assim: nem tudo o que fez causou essa bagunça toda em você. Talvez esteja buscando nessas referências de um trauma passado uma fuga para não ter que lidar com alguns conceitos que existem em você independente do que tenha te acontecido. Comece a elencar tudo o que te incomoda e te causa dor e revolta e veja até que ponto isso tudo existe por conta do que sofreu desde a infância. Ao ver que nem tudo está conectado, conseguirá deixar alguns elementos desconectados desse problema e verá como pode resolver um de cada vez.

A primeira coisa a fazer é parar de sentir raiva daquela menina e, ao mesmo tempo, não sentir mais pena de você, misturando esses sentimentos de forma tão pesada. Não irá esquecer de uma vez, tampouco deixará de ter os pesadelos... mas isso irá diminuir conforme for se conformando em ver que nada irá fazer poderá mudar o que aconteceu, mas mexerá na sua vida a partir de agora.

Quer uma boa fonte para te ajudar a superar isso? Seu filho! Mostre para ele como uma mulher deve ser tratada, eduque-o para ser aquele que vai neutralizar os efeitos de todos os que passaram por sua vida e que tanto te machucaram. Seu filho será a resposta sua para todos esses monstros que ainda aparecem à noite em sua cama. E você será responsável por isso: pegará o mal sofrido e devolverá em exemplo de ser humano a ser criado por você. É assim que irá resgatar a autonomia sobre você e seus desejos e seus pensamentos. Queira estar viva e lúcida para ver se superando de todo mal através do bem que fará ao criar um homem de verdade.

Quer tirar esse poder todo que sua tia e a todos que te machucaram têm sobre você? Mostre, dentro de você, que não vai mais deixá-los te aliciar dentro de você. Se deixar isso ainda acontecer, estará dando a eles o gosto da vitória sobre você.

Citei o diálogo no começo do texto pra você entender como há uma solução. Não há uma fórmula ideal, só você é capaz de encontrar os corredores certos que te levarão pra fora dessa clausura onde as mantém reféns de vocês mesmas. Muitas encontraram, você também encontrará. Apenas não desista. Ela está aí dentro esperando você dar-lhe a mão para ambas conseguirem respirar aqui fora. Por que não?

É foda? Pra caralho. É puxado? Mais do que imaginamos. Mas é possível.

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“Tenho 18 anos e nunca senti prazer no sexo oral. É gostoso, mas não é aquela coisa tipo de filme pornô que as mulheres se retorcem”

Posted: | por Felipe Voigt | Marcadores: 3 comentários
Querido Ogro,

Tenho 18 anos e já tive muitas relações na minha vida. Porém, nunca senti prazer no sexo oral. Bom. Expliquemos: é gostoso, sim, mas não é aquela coisa tipo de filme pornô, sabe, que as mulheres se retorcem todas?! Queria saber se é normal e o que fazer pra melhorar isso.

E também uma ajudinha pra fazer sexo oral no parceiro, porque tenho um pouco de nojo, principalmente quando goza na minha boca. Por favor, mantenha-me no anonimato, sou nova no blog estou meio perdida, rsrs...

Minha cara aspirante à Cicciolina;

Diz que já teve "muitas relações". Mas, aos 18, esse número pode ser relativo. Foram quantos? E quais idades tinham em média? Porque, em muitos casos, a falta de experiência de quem faz o sexo oral em você influencia muito no seu prazer. Tem homem que simplesmente não sabe fazer... e são muitos, acredite!

Há quem faça apenas pra cumprir tabela e receber uma chupada de volta; há quem faça mais ou menos com nojo também (viu como não é só você?); poucos são os que afundam a cara, mesmo, sem medo de melar a barba e o rosto todo, usando até o nariz e o queixo pra dar prazer à dona da referida buceta.

Mas não queira se espelhar nas performances de atrizes pornôs: elas são, justamente, atrizes! São pagas pra isso e fazem com maestria. Ou você acha que toda mulher consegue, por exemplo, transar numa dupla penetração com um sorriso daqueles no rosto? Nem todas, minha cara...

Não precisa engolir porra, não precisa ter que lidar com ela na sua cara como as atrizes fazem. Lembre-se que filmes são visuais e precisam ter todo o apelo de imagem possível para causar excitação em quem vê. Pode ser gostoso você deixa-lo gozar em seus seios ou bunda ou barriga e por aí vai. Se não se sente à vontade com essa porra perto da sua cara, vire-a para outro lado.

O que acontece é: você tem ainda muito tempo pra aprender a como ter prazer, dar prazer e aceitar receber o prazer. Isso inclui perder o nojo do sexo oral no seu parceiro. Afinal: já que tem asco em fazer, talvez também receba uma chupada quase com o mesmo nojo. Não há troca... nem de saliva, nem de fluidos, nem de energia sexual.

Exija higiene, preze pela sua e botem essas bocas pra funcionar!

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“Tenho 15 anos e não sou mais virgem. Penso em sexo o dia inteiro! Me masturbo de cinco a seis vezes por dia, sou praticamente sem controle”

Posted: | por Felipe Voigt | Marcadores: 7 comentários
Querido Ogro,

Estou muito confusa sobre mim mesma... Bem como posso explicar? Tenho 15 anos e não sou mais virgem faz três meses. Desde então não fiz mais nada com ninguém... mas eu penso em sexo o dia inteiro! Me masturbo de cinco a seis vezes por dia, sou praticamente sem controle. Quando estou na escola, perco a atenção, pois estou pensando em posições, em homens e tal...

Antes de perder minha virgindade já era assim, eu sou assim desde meus 8 anos, pois eu assistia muito essas coisas enquanto estava sozinha, mas não chegava a me masturbar pois não sabia como!

Eu tenho que me masturbar sempre, pois não me sinto bem se não fizer, fico estressada e muito nervosa. Tem dias que eu vou abraçar algum garoto e automaticamente minha mão vai na bunda dele e sem querer começo a beijar o pescoço... tem meninos que quase nem me abraçam por causa disso.

Esses dias eu soltei um gemido na rua, pois eu estava a ponto de explodir! Também já soltei alguns gemidos na sala de aula e pra disfarçar começava a cantarolar feito uma tonta! Tenho vergonha de chegar em outros meninos, pois são muito crianças, e eu gosto de homens mais velhos!

Tem noites que eu não durmo, pois estou muito excitada e tenho que fazer alguma coisa pra que acabe. Sempre estou pensando em sexo, não tem um segundo que não me passe pela cabeça isso.

Eu queria saber se é normal, isso tudo me deixa confusa, perco a atenção naquilo que estou fazendo, pois começo a lembrar de um filme pornô que eu vi, por exemplo. Tenho uma religião e eles não permitem essas coisas, e me sinto pressionada nessa parte, pois gosto disso e fico pensando em Deus, me dá um certo medo.

O que faço?

Minha cara Vesúvio;

O negócio aí está foda, hein? Entrando em ebulição, subindo pelas paredes, chamando urubu de “meu louro”, até? Ah, a explosão dos hormônios na adolescência... a grande causadora pela escassez de água no futuro! Tudo culpa dos banhos de meia hora pra apagar o fogo.

Olha, me lembro quando eu fazia isso nessa mesma época. Era quase meia dúzia por dia também, até violão me dava tesão (quem mandou ter aquelas curvas insinuantes?). Se eu encostasse o braço nos seios de alguma amiga nesses “abraços de amigo”, eu tinha que virar de lado pra não empurrá-la do outro lado da sala com o que se agigantava em meu baixo ventre! Tá, não é esse gigante todo, mas entendeu a analogia...

Duas coisas você precisa ter em mente: primeiro que isso é natural da descarga hormonal que seu corpo está sofrendo. É quase como uma rajada de ar fresco em meio ao calor infernal de um meio-dia de verão. A gente perde até consciência por conta disso, fica à mercê da resposta física e a mente acompanha o corpo. Você pensa muito nisso porque seu corpo está te bombardeando com isso.

E segundo: tome muito cuidado para não agir inconsequentemente por conta disso. Há muito homem criado e vacinado usando dessa vontade juvenil pelo sexo para se autoafirmar e tirar proveito da situação. Vão usar até como desculpa para buscar saciar os desejos, como se estivessem fazendo um favor. E nessa você pode se machucar mais do que imagina, já que não tem ainda condições de lidar com cafajestes que apenas usarão você para sexo, coisa que encontrará ao longo de toda sua vida, mas que ainda é cedo para ter que arcar com isso.

Ainda mais sabendo que há essa predileção das meninas por homens mais velhos, já que os da mesma idade ainda são crianças e não são visualmente atrativos aos apelos do corpo. Isso é culpa da nossa memória genética, onde a mulher se preparava para ser mãe mais cedo, por conta da expectativa de vida ser menor. E como os homens já crescidos eram os que tinham mais condições de proverem a prole caso essa mulher as providenciasse, o desejo ficou intrínseco no gene. É, somos vítimas dos nossos antepassados às vezes. Não somos tão evoluídos quanto pensávamos.

O que precisa fazer? Encontrar alguém com idade compatível e que seja digno de transar contigo sem querer se aparecer e sair contando pra todo mundo. Tenha consciência dos riscos e se protejam! Cuidado para não se exporem à perigos e não falo apenas das doenças ou de gravidez: não vão querer transar na esquina correndo risco de serem pegos ou de ainda encontrarem algum monstro querendo participar à força da “festinha”.

Não é vantajoso também sair com vários para saciar algo que está mais na química do corpo do que na diversidade de parceiros. Não vai querer ser tachada de algo simplesmente porque está respondendo aos estímulos hormonais. Ainda há muita gente – homens e mulheres – que apontam com dedo em riste aqueles que dão vazão aos desejos. E isso influência nas suas convenções sociais e de relacionamentos. Ainda não tem condições estruturais para suportar isso. Quando for mais crescida, saberá como fazer isso sem se importar com o que vão pensar. Mas agora a opinião alheia terá muita influência sobre você, infelizmente.

No mais, se masturbe durante o dia, durante a noite, durante o sono, durante o banho (mas desligue a porra do chuveiro...). Faça sem medo de achar que é tarada ou que está com algum problema. Isso é saudável, te deixará mais apta a conhecer os limites do seu desejo, te deixará com mais capacidade de ter prazer numa relação sem depender muito do desempenho do outro. Aproveite esse desbloqueio e tire proveito para seu autoconhecimento. Muita mulher com mais idade que você ainda não se permite se masturbar por achar que não deve ou que é errado. Não é e não tenha vergonha de gostar disso.

Mas eu só peço, mesmo, que tenha cuidado com quem deixar ter acesso a esse seu lado “louca de tesão”. Para seu bem-estar físico e emocional...

E mais uma coisa: esqueça esse lance de religião. Se depender deles, você vai transar apenas para ter filhos e viver uma vida miserável em nome de Deus. Condenam o prazer sexual, mas nunca explicam o motivo de Deus ter criado o clitóris, uma pecinha feita apenas para dar prazer e que nada tem a ver com procriação.

Se você quer realmente acreditar em Deus, não profane seu corpo com qualquer um. Essa é a melhor forma de você agir sem se sentir a pecadora que sofrerá a ira divina.
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“Encontrei pelo Facebook um homem que transou comigo e tirou fotos de mim quando eu tinha 10 anos e agora ele quer me encontrar de novo”

Posted: | por Felipe Voigt | Marcadores: 3 comentários
Querido ogro,

Já escrevi e reescrevi tantas vezes este email que dá ate desanimo. Vou tentar começar pelo princípio do meu problema: encontrei pelo Facebook a filha de um homem que transou comigo e tirou fotos de mim quando eu tinha 10 anos. Consegui o telefone dele e conversei com ele algumas vezes, não sei o que está acontecendo comigo, não sei se quero me vingar ou perdoar, achei que já tinha superado isso.

Tudo aconteceu quando ele me ofereceu uma carona para o vôlei, ele era parente distante do meu pai, tinha sido casado com uma prima minha (e pelo que se falava na família, ela se matou muito novinha com uns 15 anos e ele havia engravidado ela com 12 anos). Já se vê um padrão no comportamento dele a partir daí. Nesta carona, ele foi direto para um motel, e sem me machucar, pelo menos não fisicamente, ele tentou transar comigo. Não conseguiu porque simplesmente não entrava, eu estava assustada, mas não chorei, tentei agir como se eu fosse mais velha, estava numa fase em que queria imitar minha irmã mais velha, que tinha 15 anos, em tudo.

A partir daquele dia comecei a me interessar por meninos e não quis mais brincar de nada, nem de esconder, que era algo que antes eu adorava. Até dei meu primeiro beijo na mesma semana que aconteceu isso, mas os meninos do prédio souberam que ele havia me levado num motel e começaram a tirar sarro de mim, foi horrível.

Ele me procurou uma segunda vez e dessa vez tirou fotos minhas e me penetrou. Eu não sei explicar o que houve, mas eu me senti confusa entre estar fazendo algo sujo e ao mesmo tempo estava feliz por estar tendo a atenção de alguém (que coisa patética, eu sei). Hoje noto que fez tudo de caso pensado.

Minha irmã estava com problemas, tinha começado a se envolver com drogas e por isso resolvemos ir embora. Mudamos para outro Estado, muito longe do que tinha acontecido a mim e dos amigos da minha irmã (que, segundo meus pais, era a parte complicada). Foi uma época difícil para meus pais e resolvi só contar sobre isso que havia me acontecido anos depois, achava que eles não precisavam de mais problemas e me sentia muito culpada, até hoje acho que a culpa foi minha também.

Achei que tinha superado tudo isso até ver a foto dele. Consegui o telefone e liguei, disse quem eu era e que ele havia estragado minha vida por anos, porque com meu primeiro namorado, que fiquei por sete anos, não tive um orgasmo, me sentia suja e não gostava de sexo. Hoje, com 34 anos, estou bem resolvida neste quesito, até demais, porque gosto bastante, mas até chegar neste ponto sofri muito.

A questão que tem me atormentado é que conversei com ele no telefone e ele disse que eu que quis, que ele não me forçou, falei das fotos e ele disse que as queimou, mas não acredito nele. Disse que quer me ver, quer me explicar tudo pessoalmente. Não sei se tem explicação, acho que ele pensa que ficaria comigo de novo, será que ele é louco? Ou eu é que sou louca de falar com ele? Tenho vontade de ir a delegacia, mas sei que já prescreveu, sei também que ele tem medo de mim e não sabe o que fazer, fica ligando e ligando e tentando ser amigável.

Eu comentei com algumas pessoas bem próximas e disseram para eu esquecer, superar, mas não consigo. Será que devo me encontrar com ele, pensei em marcar em um shopping, algum lugar seguro. Será que me ajudaria a superar?

De qualquer forma escrever isso já me ajudou a colocar minhas ideias em ordem, ou pelo menos tentar. Um beijão e obrigada!


Minha cara Sherlock,

Sempre coloquei aqui que a porra do perdão a quem faz algo assim é sempre uma conversa mole: ninguém consegue perdoar um monstro que pratica atrocidade. A vontade de esganar, de devolver todo o mal causado é sempre motivo para muita raiva e consternação, porque quanto mais você tenta perdoar, mais raiva sente de si por não conseguir fazê-lo.

Mas chegar a esse ponto de confronto direto não acho que seja o ideal para você nesse momento. Revisitar assim esse passado pode ser perigoso e um atraso em qualquer progresso que tenha feito, mesmo que não o note.

Isso te aconteceu há mais de 20 anos e ainda te causa o mesmo amargo na boca e te faz engolir todo o rancor causado por tantos anos de confusão. Sexualmente você conseguiu se firmar e ter uma autonomia de prazer sem se prender tanto ao aspecto psicológico e emocional. Será que vê-lo nesse momento não te faria voltar àquela mesma estaca batida e rebatida por tanto tempo?

E outra: o que faria com ele, mesmo que o encontrasse publicamente? Você demonstra ter medo dele te causar algo, por isso propôs que se encontrassem em um “lugar seguro”, mas seguro para quem? Para você, óbvio, mas em qual sentido? Seguro para que ele não faça nada a você ou seguro para que você se controle e não faça nada contra ele?

Certamente essa onda de raiva e ódio que tanto te consumiu irá voltar acumulada e apurada, podendo fazer com que você exploda, não se controle, chore, parta para cima dele sem sequer pensar nas consequências, mas poder causar algo ainda pior: você implodir, reverter essa violência toda contra você internamente, ficando estática, sem reação, como se todo o passado a estrangulasse contra as paredes do presente. Seria quase como se você estivesse sendo violentada por ele novamente, tal qual um corte já feito, cicatrizado apenas na superfície e que arde e dói, ainda mais quando novamente cortado.

Há ainda uma outra possibilidade, talvez a mais assustadora possível: vocês se encontram e você acaba na cama com ele. Sim, por mais doentio e improvável que soe, isso pode acontecer. Certamente ele figurou por muito tempo suas fantasias sexuais, só conseguia ter prazer ao se imaginar com ele. Isso também não é culpa sua, é um truque pregado pelo cérebro confuso com as informações recebidas precocemente e as guardando de forma desordenada nos baús da memória. E de alguma forma, talvez, ao transar com ele agora, você busque, mesmo que inconsciente, uma maneira de compensar o poder que lhe fora tirado quando ele te forçou a algo que não queria. E caso isso aconteça, você se sentirá ainda mais culpada por legitimar a desculpa dele de que foi “você quem quis”.

Mas entendo o que te move: é a busca por respostas. Você não consegue entender, nada faz sentido na sua cabeça, isso te martela constantemente. A falta de resposta pode causar efeitos absurdos na mente de alguém que sofre algum tipo de violência e\ou injustiça. É o que nos faz buscar situações e condições que proporcionem experiências que possam trazer alguma elucidação. Nos viciamos, nos permitimos praticar comportamentos destoantes, nos envolvemos em relações conflitantes. Tudo é a maldita busca pela resposta...

É o que mais repito aqui e nunca será o bastante: você não teve culpa! Era uma criança, não há nada que você tenha feito que justifique o comportamento doentio desse idiota. Mesmo que ele fale que você quis... isso só comprova o quão doente ele é! Se eu sou amigo ou parente de um casal e a filha deles se acostumou a minha presença no cotidiano dela e um dia eu a convido para se sentar em meu colo para brincar e ela quis brincar comigo, é culpa dela caso eu comece a passar a mão nela? É culpa dela caso esse comportamento a faça agir de maneira diferente do esperado para a idade dela, já que está sendo apresentada a uma situação a qual ainda não tem condições de compreender ou mesmo ter o discernimento de querer ou não? A resposta está mais do que explícita...

Nada poderá desfazer o que já foi feito a você. Mas qualquer coisa que fizer agora, se não for bem ponderada, poderá te trazer de volta as sequelas que tanto luta para esquecê-las.

Não creio que você deva se encontrar com ele. Nem agora, nem nunca mais. Você não conseguiu nem conseguirá perdoá-lo, mesmo. Mas se perguntou se conseguirá se perdoar caso vá vê-lo e tudo piore depois de tanto tempo? Pra que viver com mais esse peso?

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“Descobri o sexo através de uma das empregadas. Ela tinha um relacionamento perturbado com o porteiro e o cara fez a cabeça dela pra me envolver nos jogos sexuais dos dois”

Posted: | por Felipe Voigt | Marcadores: , , 3 comentários
Querido Ogro,

Acho que é sensato, antes de qualquer coisa, te contar como achei teu blog: foi pesquisando no Google as palavras "eu odeio minha buceta pedofilia". Pronto, é isso mesmo, sem muitas firulas. Agora eu vou tentar estruturar o que me levou a querer escrever pro teu blog.

Sou a filha mais velha de um casal que sempre foi muito trabalhador. Minha mãe nunca foi do tipo que lavava, cozinhava e cuidava da casa, e por isso ela sempre dependeu de diaristas e empregadas mensais em casa. Justo na época em que eu crescia e começava a formar minhas concepções acerca dos relacionamentos humanos, minha mãe se encontrava submersa em uma profunda depressão, vítima do espírito controlador do meu pai. Não é que ele seja uma má pessoa - não é - mas se a gente se recolhe e deixa que ele tome conta da situação, ele nos afoga em suas vontades. E minha mãe, por ter um passado difícil, por ter crescido sem pai, sem referencial do que seria uma relação saudável entre um homem e uma mulher, vivia recolhida em si. Era frustrante, e eu a ODIAVA por isso. Entenda, eu nunca pude conversar com ela sobre sexo ou sobre namoros, e gostar de alguém.

Na verdade, eu descobri o sexo através de uma das empregadas que trabalhou pra gente. Ela tinha um relacionamento completamente perturbado com o porteiro do prédio em que morávamos, e, um dia, eu os flagrei em casa (devia ter por volta dos nove anos). O cara fez a cabeça dela pra me envolver nos jogos sexuais dos dois, e foi assim que me tornei um brinquedo sexual deles, por assim dizer. Não consigo recordar com clareza por quanto tempo ele "me usaram". As memórias desses tempos nunca me surgem claras ou em ordem cronológica. Creio ter sofrido o que os terapeutas chamam de dissociação. Recordo-me de momentos, isolados, mas não consigo ordená-los ou situá-los no tempo. Não posso dizer que sofri um estupro, porque entendo que para isso teria sido necessária ocorrer a penetração, certo? No começo, eles me obrigavam apenas a assistir enquanto faziam sexo na cama dos meus pais, ou na minha cama. Depois de um tempo, ela me obrigava a ficar por perto enquanto eles transavam e ele acariciava minha bunda. Daí pra tentar comer o cu, foi um passo. É sério, esse deve ter sido o dia mais estranho da minha vida, porque eu não sabia o que era aquilo, o que tava acontecendo. Ele me virou de quatro sobre a minha cama, e disse que ia me comer, acho que pôs uma camisinha e sem dó tentou forçar tudo pra dentro, só que eu gritei e ela impediu que ele continuasse - agora entendo que é porque alguém da minha família com certeza notaria e suspeitaria logo dela, que era minha babá. Uma vez ele me forçou a chupar o pau dele, eu lembro do gosto até hoje, era horrível.

Eu lembro do rosto dele, de como ele me olhava e de como eu me sentia tão pequena e suja, lembro de como ele costumava me chupar ou de como me fazia tomar nas coxas e gozava em mim depois. Eu não sei porque nunca fiz nada, ou porque nunca contei pros meus pais. Foi mais ou menos nessa época também que eu comecei a me masturbar, e isso só piorava as coisas, porque, se por um lado eu gostava das sensações físicas que sentia, por outro era extremamente errado que eu experimentasse aquilo (era como eu me sentia). Lembro que um dia escrevi no meu diário algo como "sou uma pessoa má, sou uma pessoa má por foder com o Xxxxxxxx". Foder. Que criança de 9/10 anos de idade é obrigada a saber o peso dessa palavra desde cedo? Foder é diferente de fazer amor, é diferente de sexo, é diferente de transar. Foder é mais pesado, é mais agressivo, foder não me parece adequado no vocabulário de uma menina de 10 anos. Não que seja errado que ela use essa palavra, mas porque é uma coisa muito além as compreensão de uma criança.

A pior parte é que eu sentia prazer quando ele me chupava. E por muitos e muitos anos depois disso eu sentia que era minha culpa gostar disso, que eu não tinha esse direito e que eu era uma pessoa má, suja, errada, incapaz de ser pura, boa, benevolente ou de um dia merecer o amor sincero de um cara.

Ah, detalhe, além de tudo isso, os dois ainda praticavam uma espécie de tortura psicológica comigo. O cara dizia que um dia comeria a minha mãe - e dava a entender que poderia fazer isso a força, se fosse preciso. E que tiraria meu "cabaço"(virgindade), como ele dizia em sua violência. E ela gostava de dizer que meu pai usava drogas, que ele dava em cima das moças que trabalhavam em casa, que ele tinha um filho fora do casamento… Uma vez meu pai percebeu minha tristeza e pediu pra conversar comigo a sós, e ela disse que eu seu contasse pra ele o que tava acontecendo, ele faria a mesma coisa comigo. Meu pai queria me ajudar e ela me fez ter medo dele… Quando fui crescendo, fui percebendo melhor o que eles faziam comigo e decidi que não queria mais que isso acontecesse. Foi quando eu comecei a reagir. Se ela deixava ele entrar em casa e ele vinha pra cima de mim, eu gritava ou jogava almofadas nele. EU NÃO AGUENTAVA MAIS.

Um dia, não sei o que a moça fez de errado em casa, mas ela foi despedida. Aí eu já me sentia segura em casa. Mas não saia de lá. Não brincava com outras meninas do prédio, não gostava de ter que ir comprar pão na esquina. Ele sempre dava um jeito de me encontrar pelos corredores e me abraçar ou tentar me beijar. Sempre que eu tinha que sair de casa, e estava sozinha, eu corria pelo prédio, com medo. Só contei pra alguém da família o que tinha acontecido quando tinha por volta dos 12/13 anos. Foi pra minha tia (que também é minha madrinha), e ela que pediu minha permissão pra contar sobre isso pros meus pais. Eu lembro que a minha mãe me apertou como não fazia antes, me abraçou bem apertado, e ela não conseguia falar nada e chorava muito, muito mesmo. Aquele choro sofrido, que sai bem de dentro da gente e parece que machuca mais do que a dor em si, você sabe como é? Eu me senti muito obrigada a ser forte, fingir que não era nada e que eu tava bem, porque ela não tava, e isso era claro pra mim, sabe? Meu pai ficou muito mal também, ele queria machucar aquele cara fisicamente (e só recentemente minha mãe me contou que naquela noite eles chamaram um irmão do meu pai pra fazer companhia pra ele, porque meu pai realmente queria acabar com o cara que tinha feito aquilo comigo sabe). Eu nunca, em toda a minha vida, tinha visto meu pai chorar.

Até os meus dezessete anos de idade eu vivi uma farsa. Tirava boas notas, tinha amigos, mas era retraída. Fiz terapia dos 12 aos 15, mas não aprendi nada ali, porque eu fingia estar bem e não contava meus medos e traumas pra ninguém, nem pra minha psicóloga. Eu tinha que ser forte. E eu tinha muito medo de não conseguir. Não me aproximava de garotos, e vivia num mundo completamente irreal, minha criação. Gostava de imaginar que a minha pele era bem branca e eu era loira e delicada. Chegava a me apaixonar platonicamente por pessoas (do meu convívio ou até atores famosos). Uma vez cheguei a acreditar, de verdade, que eu era mais velha e namorava/era casada com um ator de cinema. Eu sei que isso parece completamente estúpido, mas quando eu refleti sobre isso, alguns anos mais tarde, e percebi o quanto minha cabeça tava FODIDA foi que eu notei como estive perto, talvez, da real loucura. Minha avó é esquizofrênica, aliás. Ela sempre estava na casa quando essas coisas aconteciam, mas meus pais me disseram que, se a gente levasse o caso à justiça, ela não poderia ser uma testemunha por causa da condição de saúde dela :/

Quando me interessava por garotos, não conseguia me aproximar deles de jeito nenhum, e nunca fui alvo de cantadas. Eu era a amiga feia do grupo, sabe? Eu me sentia extremamente feia, e eu achava que por ter manchas no corpo, por ser gordinha, por ter a sobrancelha grossa, enfim, por não ser a típica menininha delicada, eu não merecia o amor/atenção/afeto de ninguém da minha idade. Eu sentia que só merecia a atenção de caras mais velhos e nojentos, como o cara que abusou de mim. Eu não conseguia andar na rua sozinha, nem dirigir a palavra a pessoas que não faziam parte da minha zona de conforto. Acho que perdi muita coisa nesse tempo. Meu primeiro beijo foi aos quinze anos. Minha primeira relação sexual foi aos 20 (no final de 2012).

No ano do convênio minha farsa começou a ruir. Era o ano em que as pessoas começavam a decidir o que queriam pro resto de suas vidas, e se eu só vivia em um mundo de faz de contas e evitava mergulhar em mim, como saber quem eu era ou o que queria? Voltei a ficar retraída, ia pra aula mas não prestava atenção em nada e não conversava tanto com meus amigos, passava a aula inteira escrevendo coisas sobre minhas tristezas num diário. Também usava a internet como fuga, amigos virtuais e jogos de rpg tomavam meu tempo. Isso me trazia muitos problemas com meu pai, que não entendia porque eu era assim. Foi nesse ano que voltei à terapia com a mesma psicóloga que tinha me atendido antes. (E foi por volta dessa época que minha mãe finalmente começou a se respeitar como indivíduo e sair da bolha de submissão que ela vivia. Hoje em dia ela é minha melhor amiga, e é a pessoa que eu mais amo e respeito em todo o universo. Eu sinto tanta pena dela por ter perdido muito tempo da vida sem fazer as pazes consigo mesma :/)

Mais ou menos no final desse ano, no entanto, comecei a gostar muito de um amigo da minha turma, o I. Ele era um cara muito que me atraía por ser calado e um verdadeiro mistério. E eu achava que ele retribuía esse afeto, mas JAMAIS que teria a coragem de perguntar, e a gente ficava lá, dois bobos gostando um do outro sem dizer nada.

Entrei em duas faculdades em 2010, e continuava me sentindo triste e sem perspectiva. Tive que largar a terapia de novo, por conta do horário corrido - e também porque, sinceramente, tava de saco cheio dessa médica que nunca percebeu que eu fazia uma capa de firme, mas me encontrava completamente perdida em sentimentos ruins (tudo bem, até então nem eu sabia disso, mas não era esse o papel dela?). Por essa época comecei a largar a fantasia (mesmo que ela ainda existisse, na forma de um amor platônico por um colega da faculdade, ou pelo hábito de andar na rua tentando adivinhar/projetar pensamentos nas cabeças das pessoas que cruzavam meu caminho), e comecei a mergulhar em mim, de verdade, me conhecer melhor. Foi quando eu comecei a revisitar aquelas coisas que aconteceram na minha infância e que me magoavam tanto. Esse processo levou um tempo, e foi acompanhado de muito choro de dor na madrugada, que às vezes me impedia de dormir decentemente; de morder os braços e me arranhar; de dar socos no estômago embaixo do chuveiro; e a intensificação de uma coisa que eu já fazia desde a época da escola: arranhar e cutucar/estourar umas bolinhas que apareciam nas minhas costas, braços e pernas e que são decorrentes de um processo alérgico, genético. Tenho as manchas até hoje. Inclusive, essas mesmas manchas eram causa constante de sofrimento, porque eu achava que nenhum cara gostava de mim por essas coisas que estavam erradas e eram feias em mim, como as manchas no meu rosto e nos meus braços. Cheguei a ficar com mais um cara na época de escola, mas foi completamente broxante, evitava as ligações dele, e me sentia mal por ter ficado com ele. Acho que ele chegou a comentar que eu beijava mal (recalque, Ogro, eu sei), e isso me deixou paranoica e mais frustrada ainda.

Constantemente me comparava às minhas amigas, e as achava muito mais bonitas, legais, divertidas e interessantes do que eu. Eu queria ser como elas, ou melhor, queria ser qualquer outra pessoa, menos eu. Nesse meio tempo, o I. meu amigo legal que eu achava que gostava de mim, se mudou pra outra cidade, bem distante de onde eu morava. E um dia, no meio do ano passado, eu decidi que poderia me colocar em prova, contando pra ele que eu tinha gostado dele uma vez. E foi quando ele finalmente confessou que também gostava de mim, e como ele sempre vem pra cá nas férias, ficou meio que implícito que a gente ia tentar ficar juntos no final do ano. Isso me deixava tensa, ansiosa, e completamente nervosa. Foi nessa onda de me por a prova também, que eu acabei ficando com um amigo de infância, mas a experiência foi odiosa, não senti um pingo de tesão e acho que fui completamente seca e grossa ao dispensar o cara por sms na mesma noite.

Mais ou menos em outubro de 2011 eu finalmente contei TUDO pra minha mãe. Como eu me sentia, como eu tinha certeza de que jamais conseguiria ser feliz no mundo real, de que eu não era capaz de arranjar um emprego, de ter uma família, de como eu me sentia vazia, de como eu pensava em me matar quase todos os dias, de como eu sentia que vivia na iminência de uma coisa muito ruim acontecer comigo a qualquer instante. De como nada, absolutamente nada, me dava prazer - exceto a masturbação, mas eu continuava a me sentir vazia por fazer isso periodicamente. Aí a gente procurou ajuda médica, fizemos exames, e por volta de novembro ou dezembro eu comecei a tomar medicação antidepressiva.

Em dezembro, meu amigo I. veio pra cá de novo, e no primeiro dia que a gente se viu eu tomei a iniciativa de beijar ele, mas fiz isso por achar que eu podia, mas não por realmente querer. Ainda era estranho ficar com alguém, e eu tinha certeza de que não ia dar certo, e que eu não sabia como, nem conseguiria ficar com uma pessoa firme. Eu não sei te dizer o que ele tem, ou como funciona isso, mas eu tava enganada. A gente acabou ficando e ficando, e eu me sentia cada vez mais confortável com ele. Cheguei a contar por alto o que tinha acontecido comigo quando eu era menor, e a gente tava deitado na cama e ele me abraçou bem forte e deixou que eu chorasse no ombro dele, e isso teve um significado especial pra mim. Eu senti que naquele dia esse carinha quebrou uma barreira que tinha em mim e que me impedia de confiar nas pessoas e de me abrir emocionalmente. A gente não chegou a transar, mas eu redescobri meu corpo por causa dele, pela visão dele. Os peitos que antes eram muito grandes e feios e caídos, viraram peitos bonitos e macios. O corpo que antes era OBESO virou um corpo fofo, bom de apertar (e que eu aperto mesmo, porque eu gosto de me permitir brincar comigo mesma e me conhecer a fundo). Mas eu não superei minha buceta. Eu acho minha buceta completamente feia, e já fiz muita pesquisa de fotos na internet só pra me torturar, e eu juro que isso às vezes me faz chorar o mesmo choro sofrido que eu já comentei antes; eu chego no ponto de realmente sofrer por causa disso.

Ainda assim, acho que tô num momento bom, o melhor momento que já estive desde meus 8 anos de idade. Eu nunca mais fui feliz de verdade depois disso, mas agora to tentando ser a todo o custo. E eu quero gostar de mim por inteira. Às vezes tenho recaídas assombrosas, me dá vontade de mandar todo mundo que tá perto de mim ir se foder, me dá vontade de ficar dias sem tomar banho, de não sair de casa, de não comer, de dormir o dia todo. Mas o remédio me ajuda muito. Continuo sem sair pras festas com meus amigos, mas acho que nesse semestre vou me concentrar em tentar sair e relaxar de verdade.

A questão é, como é que eu posso fazer pra gostar da minha vagina? Às vezes tenho vontade de ligar pro I. e contar isso, mas entenda, é muito estranho dizer isso para um cara ( a menos que ele seja um Ogro da internet, acho que esse tipo de cara não se incomoda com isso). Eu sou extremamente bem resolvida no que tange as questões sexuais, tenho vontade de fazer de tudo, e me sinto bem com isso. Não acho que seja vulgar, sujo ou sórdido. Descobri o sexo como a expressão do ser, como o momento em que você entra em contato com o que há de mais íntimo e interior no seu corpo - é quase xamânico; quase espiritualizado, de tão carnal e visceral que é. A questão é que eu adoraria que o I. me chupasse, mas não posso deixar que ele faça isso enquanto eu considerar minha vagina feia e repugnante.

Você entende como o nó é bem amarrado? O sexo oral era exatamente a única coisa que eu apreciava nas "relações" com aquele cara anos e anos atrás, e agora é a única barreira que eu não consigo me permitir vencer. E eu me sinto muito frustrada porque, ao contrário de alguma pessoas, eu sei disso, eu conheço o problema, mas não consigo encontrar um meio prara resolvê-lo. E, enquanto isso, ele me frustra e me machuca. Ah, eu também tenho mania de me sentir culpada por tudo que acontece. Mesmo quando é meu direito ficar chateada, eu me sinto culpada por ficar. Se brigo com alguém, e essa pessoa fica triste, eu me sinto culpada também :/

É a primeira vez que eu faço um apanhado geral dessa minha curta história de vida em forma de texto, a primeira vez que crio um registro dos meus problemas. Acho que só de escrever as coisas já ficaram mais claras. Vou te enviar a carta de qualquer forma, porque pode ser até que esse relato ajude alguma outra pessoa a tentar se conhecer melhor, e dividir a dor. Dor dividida é dor diminuída, Ogro. E eu te agradeço de antemão por ser o alvo da divisão da minha dor dessa noite.

Enquanto escrevia essa carta, lembrei de coisas, chorei, sofri, mas lembrei também que eu sou forte, muito forte, e uma pessoa boa de verdade. E isso, essa redenção que eu venho me proporcionando desde o ano passado, não tem preço. Essa é a melhor coisa que eu posso fazer por mim.

Obrigada.


Minha cara revoltada da buceta;

Lembro que li, sim, seu e-mail, e até achei que tivesse respondido, mas vi que não o fiz. Peço desculpas por isso... é que são muitos e-mails que me chegam e há muito tempo ando bem bagunçado emocionalmente – mais do que eu esperava. Assim acabo protelando respostas e isso só me deixa pior porque deixo pessoas esperando por respostas às suas dúvidas. E não há nada mais angustiante do que não ter respostas para as coisas que nos fazem muito mal e nos tomam boa parte do nosso tempo.

Depois de ler sua carta- enorme, diga-se de passagem -, vejo que você tenta estruturar muito bem as situações que lhe aconteceram, como se tudo precisasse de uma contextualização pra ser compreendida. Isso demonstra que você já buscou resposta para tudo o que aconteceu e não chegou a nenhum consenso consigo mesma.

O que te aconteceu com sua babá é uma atrocidade. E não veja isso como merecimento. Tampouco se veja como traumatizada. Algo horrível e hediondo aconteceu com você sem que você tivesse culpa por isso. Mesmo que tenha se masturbado ou tentado algo disso na época: você estava apenas repetindo algo que fisicamente era agradável, mas quando você fazia, era menos perturbador ou sujo.

Pegue uma criança hoje de 10 anos. Acarinhe sua cabeça com as unhas. Ela vai gostar, vai relaxar, fisicamente isso trará uma sensação gostosa pra ela, dará prazer a ela. E se ela gostar, o que a impede de repetir? Ou fazer com algum amigo? O que muda nisso é a postura com que fizeram um "carinho" em você: foi com malícia, com crueldade e com muita doentia de mentes extremamente monstruosas.

Realmente espero que entenda essa analogia. Não estou diminuindo o que te aconteceu, estou tentando te isentar de alguma culpa por sentir prazer em algo que sim, é prazeroso, já que a mulher possui uma parte do corpo especificamente pra isso, mas que foi errado por ser tão precoce e com alguém totalmente ingênua e inocente. Se eles tivesse te dado bebida e você ficasse bêbada, seria sua culpa? E se você depois quisesse beber mais pra sentir aquela sensação de novo, seria sua culpa? Não! É físico, é algo que está no sangue e nas terminações nervosas. O erro está em quem te apresentou esse carrossel de emoções antes de estar preparada para compreender. Você só era uma criança, não a culpe por isso... Você não era uma puta simplesmente porque não tinha cabeça, corpo e alma pra ser uma... Nem sabia o que era isso!

E outra: eles te assediavam psicologicamente, te deixando com medo, em um ambiente totalmente inseguro pra você ter voz ativa de alguma forma. Tanto é que quando seus pais souberam, você acabou tomando uma postura mais segura pra "confortá-los" na sua concepção do que seria mais confortável. Sua tentativa de fingir que estava tudo bem era uma maneira de deixar a sujeira embaixo do tapete e não ter de lidar com ela. Seja na hora em que souberam, seja na terapia que fez.

Mas assim: achar que esteve perto da loucura porque projetava paixões em atores e\ou pessoas próximas é demais. Quem nunca fez isso? Eu era apaixonado por tanta atriz e modelo nos meus 15, 16 anos... devo ter casado mentalmente com metade delas. E elas nunca descobriam que eu era bígamo. Se soubessem, dava merda e eu não estaria aqui pra contar história.

Enfim: isso é típico da idade. A projeção, a idealização... e mesmo o recolhimento ao não acessar outras pessoas próximas, como garotos da sua idade na época. Sério: todo mundo passou por isso, não é algo que te aconteceu por conta do abuso que sofreu. Todo adolescente se sente feio, todo mundo está contra nós nessa época e ninguém nos entende. Aí quando crescemos, não entendemos quem passa pelo que passamos.

Mas o problema que mais te fode: a tua buceta. Como gostar da tua buceta, você me pergunta... Olha, convencer uma mulher a gostar de uma buceta às vezes pode ser bem complicado. Mas quando se trata da própria buceta, fica mais fácil. Ainda mais no seu caso, que consegue ter um conhecimento mais profundo do que o sexo pode ser na vida de alguém.

Claro que o que te aconteceu deixará sequelas nesse nível. Ainda mais quando se trata de sexo oral, que é o que você sentia prazer de alguma forma quando aquele filho da puta fazia. E isso a fazia se sentir péssima e suja por gostar. É natural que vá buscar na lembrança física algum vestígio daquele momento. Está fisicamente em você. Mas precisa ligar o sexo oral agora à outras lembranças. Atuais, mais fortes, quando você tem a autonomia e a segurança de optar por tê-lo ou não. Antes lhe fora tomado o direito de escolher se queria ou não, mas agora você tem toda garantia se impor e escolher o que quer pra você.

Ligue o sexo a algo que está ao seu controle, como algo que você opta pelo que quer e quando quer. É seu corpo. é seu desejo, é sua libido. Está em suas mãos - algumas vezes literalmente, né?- e ninguém pode te tomar isso. E vejo que tem nesse cara um bom sujeito a te ajudar nisso. Aparentemente ele te respeita, respeita sua história, não te recriminou nem te fez se sentir mal. Pelo contrário: te fez cogitar se abrir para outro homem - de novo: às vezes, literalmente.

Ele fez com que você se gostasse, sentisse conforto com seu corpo, seus seios, suas curvas. A buceta é o próximo passo inevitável. O que pega é fazer de uma maneira que te traga prazer e te traga menos lembranças. E o jeito disso acontecer é justamente tentando evitar qualquer semelhança com o que te acontecia. Que façam isso num carro num drive, você no banco de trás, em um ambiente totalmente diferente do que lhe acontecia. Que você fique por cima da cara dele, controlando os avanços e ritmos, para que também seja diferente do que você tinha. Isso te trará uma dissociação do que aconteceu.

E mesmo que em algum momento você trave e pare e sinta repulsa e queira sair do ambiente: pare, diga que não está bom pra você, que precisa de um tempo e de um ombro e de um carinho. Se ele fez isso antes e te fez bem, certamente fará de novo. Não precisa ser perfeito na primeira vez, mas precisa haver uma primeira vez. Mesmo que doa, mesmo que te faça parar na metade: faça pra você ter um parâmetro de como reagirá a isso. Depois é que saberemos como poderá agir, minha cara... Você precisa transpor essa última barreira. Quem sabe depois disso, até mesmo o impacto do passado seja menor em você?

Você não esquecerá, você sentirá dias de profunda dor e reclusão. Se lembrará do que aconteceu e sentirá dor e ódio. Mas serão menores. E durarão horas e não dias. E verá que, mesmo que algumas vezes esse fantasma suba à sua cama, ainda assim será o seu corpo e apenas você terá direito sobre ele. E conseguirá mandá-lo de volta pro armário por mais dias e menos noites.

Aproveita que está nessa sede de melhorar e se sentir melhor. Ninguém pode tirar isso de você. Não é uma má pessoa, não fez nada de ruim pra merecer essa situação. Então acorda e vá tentar. A vida te trará várias outras dores, mas só quem sabe o quanto algo pode ser torturante e dolorido é que é capaz de desfrutar de breves momentos de alegria e sossego.

Que seja em uma simples chupada exorcizante de buceta, pois!

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